quinta-feira, 31 de julho de 2008

THE DARK KNIGHT II



Carta do telespectador Robson Monteiro:


Li o texto sobre o filme o cavaleiro das trevas e fico me perguntando por que a nona arte nunca foi abordada no programa. Sempre vemos as mesmas caras que têm sempre a mesma opinião formatada sobre os temas abordados.
Acho que valeria a pena discutir em alguns programas a importância dos quadrinhos como cultura pop. Reputo de suma importância termos uma literatura que aborda de maneira palatável idéias trazidas por pensadores gregos, filosofia, angustias etc. Acho que deveríamos abrir mais espaço na mídia brasileira, para essa literatura que alcança um número de leitores considerável no mundo todo.
Não sou contra a cultura brasileira, mas me pego questionando por que as temáticas abordadas pelos autores nacionais em obras como O Primo Basílio, A dama do Lotação etc, tem como tema quase que único a formação de triângulos amorosos, homosexualismo (se lembrarmos de O Ateneu e Capitães da Areia, para citarmos só alguns), maridos traídos e suas esposas infiéis e vice-versa. Será que é necessário mais de um livro para tratar desses temas? Por que é que tem que se remoer tanto esse tipo de literatura? Por que não fomentamos discussões sobre o papel do herói e do anti-herói na formação ética do ser humano? Tenho 33 anos li tudo que era recomendado nas escolas e não vejo por que aquela literatura é tão bajulada na mídia. As melhores coisas que li não foram recomendadas na escola. Gostaria de saber por que não debatemos, por exemplo, o porquê de nenhum professor indicar os livros 1984, ou Admirável Mundo Novo, A Pílula Vermelha, O Anticristo etc.
Só para finalizar a minha defesa para que o tema quadrinhos seja discutido em algum programa é bom lembrarmos que entre os maiores romances do mundo está a grafic novell Watchmen, de Allan More.

terça-feira, 13 de maio de 2008

RÁPIDAS, MAS SEM RASTEIRAS...

por Cristiano Ramos

O Opinião Pernambuco carrega nos ombros cansados aquela pretensão de ser um espaço de mídia democrático. Isso inclui até veicular “no ar” os comentários não exatamente entusiastas do contraditório. Nos últimos meses, recebemos ofensas as mais criativas, via telefone, por realizar discussões sobre homossexualidade, socialismo, descriminalização da maconha... Todos os ataques partem do pressuposto que “uma TV pública não deveria se ocupar de tais absurdos”. Passados 40 anos do mítico 1968, será hora de novamente sair às ruas gritando que é proibido proibir!? Ou estamos realmente nos excedendo? Enquanto a dúvida prossegue, os críticos bem que podiam amenizar o vocabulário com os coitados dos estagiários, que, com a maior boa vontade, estão lá todas as noites registrando as perguntas e opiniões. Até porque a maioria deles não recebe bolsa, quem dirá gratificação por insalubridade. No mais, qualquer coisa é só apertar o botão do controle, enquanto a pilha não seca.

Embora cheia de boas e mui perfumadas intenções, a Sexta Cultural é apenas um segmento dentro do Opinião, sessenta minutinhos de bate-papo, com comentaristas fixos e eventuais convidados. No formato Manhattan Conexion (ou, como prefere Walmir Chagas, Santo-Amaro Conexion). Então não há como atender à demanda de autores que nos enviam livros. Ainda alimentamos a vontade de produzir um programa apenas sobre literatura. Mas, entre querer e poder, fica uma porta que dá na sala do diretor-geral, Paulo Jardel, além das dificuldades típicas das emissoras públicas espalhadas pelo país. E, assim, vamos comendo pelas beiradas, que teimam em não acabar.

Para os telespectadores mais atentos (e isso é quer dizer "um bocado de gente"), já chama atenção o fato de termos realizado duas rodadas de entrevistas com os pré-candidatos a Prefeitura do Recife, ambas com a ausência de Cadoca. Ratificamos que o mesmo sempre diz não ter disponibilidade, ou então marca data e depois cancela. Isso inclusive já nos acarretou a necessidade de reprisar algum programa. Sendo assim, damos por encerradas as tentativas. Até porque consideramos legítima a definição de prioridades da assessoria do político, assim como a nossa, de resolver que é momento de gastar pique com outras pautas. Pois, como a equipe de produção é toda sedentária, o fôlego anda devagar, quase parando.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

ODE À MISÉRIA CORRIGIDA


Com a ajuda do Fernando Neto, telespectador do Opinião e internauta sempre atento, finalmente vamos postar o texto corrigido do Manuel Tavares, Ode à Miséria, lido por Walmir Chagas no ar.




Hoje não cantarei o Recife de Manuel Bandeira
Da lira e das bandeiras liberais;
O Recife do "chicote queimado" da Rua da União
Do "coelho sai-não sai"
Hoje cantarei o Recife das mulheres da vida
E desses homens marginais
O Recife dos loucos, que estendem a mão e riem de si mesmos
Como se fossem seres tão normais.

Hoje cantarei o Recife dos heróis sem glórias e sem nomes
Cuja lista daria, tranquilamente,
Pra encher as estantes da Academia de Londres
Sim, hoje cantarei o Recife dos mangues, das palafitas,
Das crianças exangues,
Que teimam em existir.
O Recife das crianças que andam sobre a lama em busca de siri.

Hoje cantarei o Recife do "É melhor partir"

"Mamãe, acho que vou pro Rio de Janeiro
Porque lá não tem um rio que fede como este aqui"!
Mas o rio Capibaribe não escuta,
Porque está preocupado em molhar a várzea
Pra desovar a miséria. O Recife é coisa séria!
Às vezes esquisito, às vezes esquistossomose.
E enquanto um delira, o outro morre
Sem saber do quê, por quê e para quê.
E lá no Bar Savoy, tantos de porre!
Lá no Bar Savoy, onde o poeta Carlos Pena nunca disse:
"Recife, eu tenho pena de você".

Hoje não cantarei o Recife das pontes, nem da Família Pontes;
Nem dos Vieira, nem dos Freire, nem dos Bandeira.
Cantarei o Recife das pontes entre a miséria do ser e do não ser.
Hoje cantarei o Recife dos mendigos,
Desses artistas de circo, que saltam do trapézio pra morrer.

Hoje cantarei o Recife das igrejas , da erva, do porre e do xixi
Mas não cantarei o Recife do Cinema Moderno**, de terno,
Pois o filme real dessa cidade não passa alí.
Mesmo assim, eu não vou para Pasárgada!
EU QUERO É FICAR AQUI!!!

quarta-feira, 30 de abril de 2008

PRÊMIO CRISTINA TAVARES



CONFIRA A LISTA DE VENCEDORES

Categoria Estudante Jornalismo Impresso - Texto
Medicina e Dependência Química - Projeto Experimental UFPE - Conceição Gama

Categoria Estudante Jornalismo Impresso - Foto
Quilombola - José Osmário Marques de Oliveira - Publicada no DP

Categoria Assessoria de Imprensa
Um Outro Olhar Sobre o Semi-árido Brasileiro - Fábia Lopes/Fernanda Cruz/Gleiciani Nogueira/Viviane Brochardt - Asa.com

Categoria Telejornalismo - Documentário
"A Última Diva - Projeto Experimental - Nelson José de Castro Sanpaio Júnior - (Veiculado na TV Universitária)

Categoria Online
A Retomada Indígena - Julliana de Melo Correia e Sá/Inês Calado/Jacques Waller - JC OnLine

Categoria Jornalismo Impresso - Foto Isolada
Fuga do Inferno - Chico Porto - JC

Categoria Jornalismo Impresso - Criação Gráfica
O Senhor do Tempo - 80 Anos de Brennand - Fabiana Martins dos Santos - JC

Categoria Radiojornalismo
O Som da Paixão - Mattheus Sampaio - Rádio Jornal AM
Menção Honrosa
Água: Evite o Desperdício Deste Bem Público - Mattheus Sampaio - Rádio Jornal AM

Categoria Telejornalismo - Reportagem
Coque: Um Novo Olhar - Ulisses Antônio Brandão de Souza/Alissa Farias-TV Jornal

Categoria Jornalismo Impresso - Foto Seqüência e Ensaio Fotográfico
Faltam Letras. Sobram Sonhos - Alcione Ferreira – DP

Categoria Jornalismo Impresso - Desenho para Imprensa
Retrospectiva 2007 - Samuca - DP

Categoria Texto
A Escolha de Sílvio - Fred Figueiroa de Faria Filho - DP

Categoria Texto Séries/Reportagens e Coberturas Especiais
Pernambuco Não é Mais Aqui - Vandeck Santiago - DP

domingo, 27 de abril de 2008

MANUEL TAVARES LIDO POR WALMIR CHAGAS


Caros, depois de muitos pedidos de telespectadores, eis os versos de Manuel Tavares (Ode à Miséria) lidos por Walmir Chagas no ar. Ele os recitou também na abertura do espetáculo Sou feio e moro longe. Porém, copiei de anotações do próprio Walmir, e creio que há muitas incorreções de pontuação etc. Então, se alguém puder disponibilizá-los no original, agradeço.

Hoje não cantarei o Recife de Manuel Bandeira, o Recife da lira e das bandeiras liberais, o Recife do chicote queimado na Rua da União, do coelho sai! Não sai! O coelho sai! Não sai. Hoje cantarei o Recife das mulheres da vida, e desses homens marginais, o Recife dos loucos que riem de si mesmos como se fossem seres tão normais. O Recife sem glória e sem nomes. Cuja lista daria tranquilamente para encher as estantes da academia real de Londres. Hoje cantarei o Recife dos mangues das crianças exangues que teimam em existir. O Recife das crianças que andam sobre a lama em busca de um siri. Hoje cantarei o Recife do “É melhor partir!” – “Mamãe, eu vou pro Rio de Janeiro, acho que lá não tem um rio que fede igual a esse aqui!”, mas o rio Capibaribe não escuta porque está preocupado em molhar a várzea para desovar a miséria. Recife é coisa séria, às vezes esquisito, às vezes esquistossomose, e lá no bar Savoy, tantos de porre, lá no bar Savoy onde o poeta Carlos Pena Filho nunca disse “Recife, eu tenho pena de você!”. Hoje eu cantarei o Recife das pontes, mas não da família Pontes, nem Freyre, nem Bandeira. Hoje cantarei o Recife das pontes entre a bastança do ter e do não ter, o Recife dos mendigos, desses artistas de circo que saltam do trapézio pra morrer. Tampouco cantarei o Recife de terno, do cinema Moderno, pois o verdadeiro filme dessa cidade não passava ali. Cantarei o Recife das igrejas, da erva e da cerveja, do porre e do xixi. “Eu não quero ir pra Pasárgada, eu quero ficar aqui!!”.

Poema de telespectador

ILUSÃO
Solilóquio de sentimentos
impuros numa noite de
eternas,
verdades claras.

Um corpo,
bebida de mentiras
alcoolizadas.
Lâmina cega,
cortando a visão
do espírito.

Insurreição de gestos
presos
em passos lentos.
Imagem refletida
no espelho da alma...
Já não tem o mesmo
tamanho.

Cedro da lei espiritual
não está longe,
inconsciente.
Idade que perdura
na escuridão.

Inábil ser no
trampolim
da iniqüidade.
Corpo no solo do mundo,
corpo solo no mundo.
Barricada de uma
existência
sofrida.

Deus do vento,
da terra...
Deus do pensamento,
da vida...
Além da morte.

Antagônico Humano
humo...
Engodo da covardia,
mesmo que a vitória tardia.
Adeus a um corpo,
Despedida Vida na lâmina
cega.
Destroçar a própria ilusão
seguindo o
caminho.
Fernando Matos

sábado, 19 de abril de 2008

ENTREVISTA: ALFREDO BERTINI


"Hoje a gente percebe que o cinema pernambucano está na vanguarda, basta para isso ver as conquistas nacionais e internacionais"



Idealizador do Cine PE Festival do Audivisual, Alfredo Bertini concedeu entrevista ao Blog da Sexta, depoimento onde relembra a criação do evento e ratifica a importância do mesmo - um dos principais festivais do país, considerado o de maior público.
Como surgiu a idéia de fazer um festival de cinema na cidade do recife?

Estava como secretário adjunto de indústria, comércio e turismo, no governo de Joaquim Francisco, quando tive contato com o setor cinematográfico. Comecei a entender o sentido econômico, o contexto da "indústria", para o qual o audiovisual como um todo já dava sinais de fortalecimento. Assim, inspirado naquela oportunidade pelo sucesso do Festival de Gramado, senti que havia espaço para se trabalhar algo semelhante, não só observando o caso pelo aspecto turístico (muito forte em Gramado), já que a cultura e a história audiovisual de Pernambuco tinham expressão suficiente para absorver a idéia. Um pouco mais de toda essa história está no livro anterior que escrevi pelos 10 anos do evento: Quando o caso é de Cinema, a paixão é um Festival.



Como você vê a evolução do cinema pernambucano? E qual a contribuição do Cine PE?

O Festival e o novo cinema pernambucano são também frutos da aposta que se fez na retomada da produção brasileira. Há uma simultaneidade não planejada nessa história, posto que os fatos marcharam para essa direção. É claro que a história do cinema pernambucano e a própria riqueza cultural da nossa terra também exerceram influências. Hoje a gente percebe que o cinema pernambucano está na vanguarda, basta para isso ver as conquistas nacionais e internacionais. E o festival, por sua vez, ocupando um espaço privilegiado no cenário brasileiro, considerado aquele que mais leva público e um dos mais respeitados do país, apesar de sua juventude. E certamente que o Cine PE hoje já representa uma vitrine de interesse, não só para os novos talentos da terra, como para os cineastas de todo Brasil.

Qual o espaço reservado aos filmes pernambucanos no Cine PE?

É um festival de reconhecimento e dimensão nacional. E, nessa condição, não deve perder de vista seu compromisso com a diversidade cultural expressa pelos quadrantes do país. Assim, os filmes da terra passam pelo crivo do processo seletivo, muito embora seja sempre bem vista a presença da produção local, desde que exprima uma qualidade compatível com a referência hoje conquistada pelo Cine PE. Todavia, como a produção cresceu além das expectativas, esta edição de 2008 apresenta uma de suas novidades: a Mostra Pernambuco. Trata-se dos filmes que obtiveram qualificações junto às comissões de seleção e que precisam compor essa janela nova de exibição. Estamos, para esse fim, tentando uma premiação extra em dinheiro como estímulo. Mas, se não der para este ano, a semente já se encontra plantada pata as próximas edições.

Alguma outra novidade para este ano?

Apesar do modelo estrutural ser o mesmo, a cada ano são incorporadas inovações. Isso passa pela linguagem de comunicação, assim como por tarefas de conteúdo programático, propriamente dito. Neste particular, por exemplo, além da primeira edição da Mostra Pernambuco, pela primeira vez a itinerância das exibições é deslocada para Porto de Galinhas. Trata-se de um esforço novo na direção de agregar um importante valor cultural ao mais badalado destino turístico de Pernambuco. Tudo na defesa de um padrão de entretenimento que expresse a importância da preservação e valorização das identidades.

Pode explicar um pouco mais o processo de seleção dos filmes exibidos no festival?

O Cine PE opera com o modelo tradicional das comissões de seleção, que se reclusam por uma semana, justamente para efetivar a difícil missão de escolher os filmes que estarão na grade competitiva. Como a acada ano o volume de inscritos tem aumentado consideravelmente, esse trabalho se revela como um dos mais árduos. Por exemplo, para amenizar a carga de tantos filmes (foram mais de 70 longas), adotamos neste ano, para o caso dos longas-metragens, um ponto de corte em cima da questão do ineditismo, mas sem perder de vista o padrão de qualidade do festival.



Como você observa a consolidação do Cine PE no circuito de cinema do país?

Como mero resultado de muito trabalho e dedicação, sobretudo, de uma equipe que se mostra cada vez mais apaixonada pela causa que abraçou. Por toda essa engrenagem para funcionar, não é uma tarefa de produção simples, pois envolve diversos setores. A cadeia produtiva do Cine PE representa um emaranhado bem expressivo, posto que envolve centenas de pessoas, direta e indiretamente comprometidas. São 10 meses de trabalho constante, que tem seu ápice nervoso justo na semana de referência do evento. Com todo esse esforço concentrado, o resultado é que o Cine Pe, em tão pouco tempo, conquistou um espaço nobre na galeria dos grandes festivais. Afinal, ele representa o que há de maior em termos de platéia (são 3 mil pessoas por sessão), goza de prestígio e possui uma significativa reverberação na mídia.

Qual sua análise sobre o investimento na área do audiovisual?

Ele é uma atividade econômica que exige inversões grandiosas. Por essa razão, a demanda por recursos para o setor nem sempre é entendida de modo adequado, haja vista o baixo entendimento com relação ao seu porte. Já ocorreram alguns avanços em termos de políticas públicas nas três esferas, mas ainda é preciso esse entendimento da ordem de grandeza do setor, visto pelo impacto sócio-econômico (na geração de empregos e rendas) e pelo seu poder midiático. [confira a programação do Cine PE]


A entrevista foi realizada por André Lucena, Branca Alves, Léo Leite, Manuela Clericuzi e Rafael Montenegro, estudantes de Comunicação Social e produtores do Opinião Pernambuco.

CRÍTICA EM IMPROVISO

por Cristhiano Aguiar


Que formas podem tomar a interlocução entre escritores e críticos? Quais os possíveis atritos surgidos a partir daí? Pensar de que maneira adultos (às vezes, nem tão adultos) lidam com o vínculo afetivo que estabelecem com suas criações literárias e argumentações críticas parece ser um importante aspecto deste tópico.

Infelizmente, falar de “afeto”, ou “maturidade”, foge dos meus próprios pressupostos teóricos. Também não sei se estas questões interessam ao estudo da literatura, no final das contas, a não ser como curiosidades ou croniquetas, como a deste post e do anterior [ver observação ao final deste texto].

Escrevi um artigo sobre um jovem romancista, que obteve muito destaque na imprensa. O autor tem muito potencial, mas me parece ainda necessitar de amadurecimento. Por isso, fiz algumas ressalvas quanto ao romance que eu estudava no artigo. Decidi fazer o que muitos críticos e pesquisadores não fazem: mandei o texto para o autor. Ele me respondeu, agradecendo, comentando e elogiando a minha leitura.

Aqui, quero chamar a atenção de vocês para uma questão. Até que ponto seria importante enviar o texto ao autor sobre o qual se escreve? Se a intenção não é só fazer uma certa política literária, por que enviar, então? Neste gesto se procura, por exemplo, algum tipo de chancela à própria leitura crítica?

Com estes questionamentos, não quero dizer que enviar um texto para um autor seja uma prática espúria. Muito pelo contrário. Entretanto, antes de apertar o botão “enviar” do nosso e-mail, considero saudável uma pausa.

No fim das contas, a pergunta surgirá: “pra que crítica?”; que se desdobrará em “por que este texto que leio?”. Hoje, não creio que tudo que escrevemos sobre o poeta ou contista Y deva ser enviado para ele. Um diálogo bom é um diálogo com propósito.

Qual foi o resultado do envio daquele artigo? Algum tempo depois, o autor, que tem um blog, fez várias indiretas irônicas contra meu texto. Uma coisa bem mal-humorada, mesmo. Além disso, em seguida, o texto dele caiu no velho clichê de “não me importo com o que a academia diz, etc”.

Continuo gostando da obra deste escritor. Embora considere o seu livro mais recente fraco, já li uns trechos do seu romance novo (que ainda será publicado) e me pareceu bem interessante. Mas confesso que, nos instantes nos quais, dentro ou fora da universidade, me questionam como posso gostar da obra deste romancista, continuo acentuando qualidades e ressalvas, porém não com a mesma empolgação de antes.

Cristhiano Aguiar é escritor, crítico e mestrando em Teoria da Literatura (UFPE). Este texto foi originalmente publicado no blog da Revista Crispim, como continuação de um post anterior. Confiram!

quarta-feira, 16 de abril de 2008

A TÉNÉBREUSE UNITÉ DE UMA POESIA ALÉM

por Cristiano Ramos

Sobre o poeta Everardo Norões e seu livro A rua do Padre Inglês. Uma obra que se propõe ir além


Comme de longs échos qui de loin se confondent
Dans une ténébreuse et profonde unité,
Vaste comme la nuit et comme la clarté,
Les parfums, les couleurs et les sons se répondent.

Como os ecos ao longe confundem seus rumores
Na mais profunda e tenebrosa unidade,
Tão vasta como a noite e como a claridade,
Harmonizam-se os sons, os perfumes, as cores.

Baudelaire




Para o leitor mais agudo, memórias vividas e lidas se confundem como fotografias misturadas em um baú. Mas, ao mergulhar na vasta poesia contemporânea, não raramente há quem sinta o desolamento de não reconhecer (entre tantos versos) a grandeza daquelas imagens que se destacaram nas leituras de uma vida inteira.


Everardo Norões desenterra de sob os seixos esta razão maior da poesia. A rua do Padre Inglês nos traz um apanhado de sua obra, uma amostra de sua argamassa poética onde se coadunam tradição e moderníssimas demandas existenciais – obra que, por motivos decerto injustificáveis (embora presumíveis), segue desconhecida por tantos.


Uma proposta perpassa todo o livro: recuperar o sentido poético da transcendência. Não aquela de uma conservadora burguesia inglesa imersa em misticismo em pleno século XIX, mas a transcendência clássica, em que estética e filosofia não se deixam reduzir a efêmeros empreendimentos. Os versos de Everardo Norões querem mais, buscam além. Embora nunca uma criação distanciada da paisagem ou dos dramas que a circundam.

O meu país
é uma vereda de loucos.
Linha de serranias
degolando o sol.
cheiro de cana azeda,
a palma de buritis,
relho de sesmarias.
(País)



Leitor e pensador atento de nossa literatura, o autor de A rua do Padre Inglês calcorreia a pauta do dia. Através de sua postura convicta, dialoga com questões atualíssimas de nossa produção. Não foge, por exemplo, ao desafio que hoje nos impõe a ruptura modernista: como não negar a herança e, ao mesmo tempo, fugir da armadilha de tradicionalizar o que antes foi inovação contestadora, transgressão? Embora Norões dificilmente aceitasse a comparação, visto que rejeita a própria noção de pós-modernismo, seus poemas vencem com enganosa facilidade esse obstáculo.


Eis fragmento onde enfrenta a pergunta que costuma afundar pencas de jovens poetas em cansativas tentativas visuais, lugares-comuns ou gritos inócuos:

O que será de mim
no sossego dessas praças mortas,
na angústia dos estacionamentos,
no frio das salas de espera,
quando o outro,
o sempre múltiplo,
pergunta:
O que será de ti?

O que será de mim
quando os besouros esquecerem
as lâmpadas dos postes
ou o vento passar sem varrer nossas cinzas?
(As réstias de muxarabiê)



Mas esqueçamos os rótulos ou debates categorizantes. O que pesa são suas imagens, além do demasiado humano. Nenhum baú, por mais vasto e rico, amontoará com indiferença os seus fractais, que se nos apresentam com assustadora elegância: “Pelo mergulho / das sombras, / calculo / o itinerário da luz”.


São versos que requerem do leitor um ritmo, respeito às intenções sonoras, e tempo para dar nitidez aos significados. Pressa ou pobreza na entrega resultará em desperdício da obra. Assim como, aos interessados em buscar o significado das tantas referências presentes no texto, a experiência de cada página pode se desdobrar em inúmeras outras descobertas. Ex-exilado político, Norões foi obrigado a conhecer outros países, descobrindo-se um irremediável interessado nas mais diversas culturas. Durante todo o livro, somos convidados a viajar com o autor, principalmente por referências orientais, como nas belas estrofes dedicadas àquela conhecida como a maior das cantoras árabes:

Era como se um Deus houvesse sucumbido
e uma única mulher lamentasse seus remorsos.
E o céu brilhasse, entre as areias,
nas cinzas de seus ossos.

Era como se um Deus houvesse caminhado
no fio dos sentidos, e ao seu lado
um peregrino cego lhe guiasse
e, súbito,
calasse.

Era como se um Deus houvesse se encontrado
na única pedra de um deserto.
E ao sol nos doasse
a outra face.

(Oum Kalsoum)


Por tudo isso, o próprio poeta cria exigências à sua obra. Não lhe cabe mais captar o instante sem maiores intenções, ou se desviar da grandeza que os versos parecem lhe exigir. Daí, destoa uma peça como Vinho Branco Seco (“Entre o silêncio obsceno / e o cálice de vinho seco / perco-me na sede / do teu asco”). Mesmo que sejam motivos e imagens dignas de atenção, há inúmeros outros autores para lhes perpetuar a imagem e repetir fórmulas.


Todavia, qualquer “senão” apenas ressalta todo o mais. Uma poesia que nos traz a densa atmosfera baudelairiana, as desconcertantes correspondências, a metafísica comprometida com nossas infindáveis lacerações. Aquele acostumado com essa ténébreuse unité, reencontrará neste pernambucano-do-mundo aquele negativismo, a sombria decadência onde não existem copas ou telheiros para nos resguardar. Momento nenhum de Everardo Norões há de acalentar espíritos desejosos por uma temporada no Paraíso. O que não quer dizer que, envoltos em “sombra” e “escuridão", seus versos nos compelem a desistir. Antes, lançam-nos à caminhada dostoievskiana, onde o coração humano é o campo de batalha, certos de que a dor apenas ratifica nossa existência e sublinha o que de sensível ainda nos acompanha.

Agonizam os rastros de novembro.
E os meus ossos, cansados das neblinas,
doíam, no concerto das esquinas
da cidade, onde um dia, ainda me lembro,

Penetrou-se de escuro a minha alma,
quando um cão, a ladrar contra o sol-posto,
mordeu o lado oculto do meu rosto
e deixou seus sinais à minha palma.

(Soneto I)



“Na linha negra que decepa o sol trafegam infinitas palavras”... E estas linhas são afiadas, este sol é fecundo. Não de forma imprudente – embora com o entusiasmo típico dos textos de apresentação e prefácios – Marco Lucchesi afirma que “seria preciso escrever quase um ensaio para dizer as afinidades que nos cercam e transcendem, as palavras muitas que guardamos e os silêncios que transmitimos”. Todavia, nem a mais fria análise seria indiferente ao empenho autêntico de Everardo Norões em acrescentar, não se rendendo às correntes e modismos.

Em tempos de antologias circulares e redes de afinidades que confundem crítica com reverberação laudatória, difícil esperar que o autor de A rua do Padre Inglês conquiste maiores espaços, senão nos amplos átrios de consciências desejosas em extrair dos contraditórios o melhor da produção contemporânea.


Cristiano Ramos é jornalista e crítico literário. Editor deste blog, além de diretor e apresentador do programa Opinião Pernambuco.

ALERTA GLOBAL

por Marcelo Pelizzoli




quem interessa fechar os olhos e desmentir o Aquecimento Global ?
A quem interessa condenar ecologistas e taxar militantes como radicais


Uma avestruz, quando tem medo, mete a cabeça sob a terra, e dá margem a ser devorada por predadores. O mundo ocidental, pós-Revolução Científica e Industrial, e o malfadado capitalismo (do eurocentrismo branco ao american way of life), tendo “vencido” o mundo primitivo, chamado de “selvagem” (como os “índios”), conquistando a Lua e parte da matéria e da energia, vê-se em processo autofágico (auto-devoramento). Tal processo emerge a cada dia de uma série causal complexa de degradações constantes, que se assomam num continuum que reverbera por muitos anos depois de ocorrida uma ação. A exemplo de um lixão, que mais tarde compromete toda uma região de lençóis freáticos, ou a exemplo de um consumo inconsciente com alimentação artificial e quimificada, que em alguns anos gera um câncer ou um a série de doenças degenerativas (há uma “epidemia” delas hoje).

Demoraram-se longos anos para que o establishment, a oficialidade do poder (Governos, G8, por exemplo) aceitasse, a duras penas, a verdade inconveniente de que estamos num caos crescente social e ambiental (uso a palavra socioambiental para indicar que é um só processo!). É claro que, daí para a prática, “são outros quinhentos”. O alerta começou a ser dado no início do século XX, tendo como marco especial nos anos 50 a ameaça atômica real, e depois os colapsos ecológicos espelhados nas crises energéticas, de recursos, lutas por territórios, água, migrações de populações inteiras por questões de carência de recursos, problemas graves de saneamento, mortalidade e insanidade, e qualidade de vida comprometida devido a condições de poluição em geral, alimentação precária e artificial, uso de inseticidas, agrotóxicos, e uma gama de outros elementos agregados que nos matam antes da hora. Tudo isso a demandar quantidades crescentes de energia e materiais (natureza). Estamos nos encaminhando para o auge desta crise. O estopim disso se chama Aquecimento Global. Entender isso apenas como aumento de temperatura do planeta é um reducionismo inaceitável, mais ainda por parte de pessoas esclarecidas. E entender Ecologia ou ambientalismo apenas como conservação natural, é outro reducionismo perverso.

A quem interessa fechar os olhos e desmentir o Aquecimento Global ? A quem interessa condenar ecologistas e taxar militantes como radicais (isso deveria ser elogio, radical: ir à raiz)? Tem sido uma das formas clássicas de quem se sente atingido, atacar no “modo (des)moralizante”, bastante sutil mas hipócrita (como quando Color de Mello disse que Lula tinha um aparelho de som caro e que ele não tinha). Neste sentido, já vi textos acusando Al Gore, autor do filme talvez o mais importante deste século - Verdade Inconveniente [ver ficha no post acima] - de gastar 5 mil dólares na conta de luz por mês ! Mas a mentira tem pernas curtas.

Vejo somente algumas alternativas para responder à negação da amplitude da crise e, consequentemente, da defesa do status quo: Hipótese 1: alguém quer ir contra 800 cientistas renomados contatados pela painel da ONU sobre Mudanças Climáticas, e contra o que estamos sentindo na pele a cada dia (degradação socioecológica), e assim ganhar holofotes numa mídia sensacionalista. Alguns conseguem isso. Mas há mais. Hipótese 2: alguém com interesses escusos, servindo àqueles que vêem seus negócios afetados pela diminuição do consumo e pela consciência cidadã e planetária. Esse é um caso muito comum. Nos EUA, a indústria do Petróleo e as que demandam energias imensas, e de alto impacto em gases de efeito estufa, são exemplos. Muitas vezes, ONGs, cientistas, sindicatos, pastores, mídia, são comprados constantemente para mentir em nome de alguns Senhores.

Consideremos, por um minuto, que um indivíduo que nega o aquecimento global tenha razão? Pergunta-se: a quem serve o resultado desta “verdade conveniente” ? O que ele nega junto? Nós deveríamos parar de economizar cada vez mais energia elétrica ? Deveríamos, por causa da verdade dessa falação, andar sempre de carro e produzir mais poluição e problemas respiratórios e engarrafamento ? Deveríamos priorizar menos o transporte público ? Deveríamos parar de consumir cada vez mais, e continuar a poluir de todos os tipos nossos ambientes ? Deveríamos continuar a destruir os nossos ecossistemas? Deveríamos continuar com valores egocentrados num individualismo grosseiro que faz perder a noção de interdependência de todos os seres e do destino comum dos que vivem num planeta limitado ? Deveríamos abandonar o trabalho exemplar do Painel da ONU e de Al Gore e toda a consciência que estão trazendo aos povos ? Vejam o absurdo a que chega uma tal negação.


Não se trata de uma brincadeira. Não podemos brincar com o futuro de nossos filhos, e o presente que já nos pesa. O vertiginoso aumento de temperatura nos últimos anos com a comprovação consecutiva e comparativa exaustiva da alteração do ciclo uso do carbono desde a sociedade industrial é gritante. É uma questão da mais alta responsabilidade e da coletividade. Não obstante, não podemos entender isso como simples aumento de temperatura por caprichos de eras climáticas de nosso planeta. Esqueçamos um pouco o aquecimento em si, olhemos para baixo e para os lados e um pouco adiante! Somente posso entender mais humanamente a negação dos aspectos graves da crise ecológica e social em que vivemos se ligo este fato com o medo e a dor das pessoas quanto a aceitar certas realidades. Isso seria mais humano e humilde. Dói profundamente saber que estamos num caminho com estilo de vida profundamente anti-social e anti-ecológico; os fatos arrasam. Ou seja, admitir que o nosso capitalismo (e nós todos o somos em maior ou menor grau), levou nossa loucura egóica a tal intensidade que gera retroações e quedas as quais queremos evitar. E então, se ouve as vezes dizer: “está tudo bem”, “está tudo bem”, são apenas detalhes e a tecnologia e a política liberal, o crescimento econômico “vão resolver isso”! Ninguém mais, de bom senso e sensibilidade, tem coragem de negar o quão fundo chegamos, gerando violências de todo tipo, perda de valores, degradação de culturas, exclusão social, relações de poder hipócritas e exploratórias, uma selvageria manifesta em especial no Hemisfério Sul do Planeta, mas também no Norte. Por que defender um modelo assim? American way of life. Superman. Até quando ? Por que negar nossa situação e vulnerabilidade? Por que querer ser Deus? Onde queremos levar nosso ego para que ele escape da minha responsabilidade cada vez maior e dos meus limites?

A injustiça clama aos céus, diz o texto sagrado. Em todo caso, não precisamos desanimar diante da situação. Ela nos clama pois não queremos uma vida arruinada, mas boa, evitando o sofrimento, buscando a felicidade, mesmo nas coisas simples da vida, na partilha, na socialização, na cultura. Alegria, amizade, culturas locais, cidadania, sim. Mas não podemos mais viver num mundo de “faz de conta”. Não estamos mais na Era da Abundância e no infantil “Alice no país das maravilhas”, e, certas “verdades” que herdamos de nossos pais, mesmo professores (com viseiras), ou até de coronéis, hoje coronéis empresários, estão quase todas obsoletas, e por isso se tornam altamente perigosas, pois mesmo sendo por vezes religiosas, morais, perpetuam a dilapidação a que é jogada a grande população, tanto quanto o que chamamos de natureza. Viva o progresso? Viva a cana e a monocultura ? A pecuária extensiva? O Petróleo? Viva a sociedade industrial crescente? Viva cada vez mais automóveis e a Economia dinossáurica? E qual o destino do ser humano a cada dia ? Doenças e epidemias, poluição, depressão, perda de sentido num mundo burguês que perdeu o controle sobre seus monstros ? É isso que queremos ?

A maneira de a natureza nos responder dá-se com avisos crescentes e arrepiantes: desordens climáticas potencializando efeitos de chuvas, secas, furacões, inversões térmicas inesperadas. Doenças novas ou doenças antigas que retornam. Vírus que se fortalecem com antibióticos e se potencializam. “Vaca louca”, gripe do frango, plantações que florescem antes da hora, aumento de “pragas” tanto animais quanto vegetais; doenças que campeiam o mundo pobre, mas também o rico. Lutar contra esse estado de coisas não quer dizer simplesmente voltar a um mundo romântico, ao passado e a algum paraíso que não existe mais, negando toda a tecnologia. E não é também ser apenas “do contra”, esquedista etc. Mas é, antes de tudo, uma síntese, para a qual muito temos a nos preparar – sustentabilidade - exigindo cada vez mais mudanças, desacomodamento, criatividade, tecnologias brandas, agricultura ecológica, familiar, distribuição de terras e política agrícola, cumprimento da legislação ambiental, economia solidária e ecológica, bioconstruções, fiscalizações de todo tipo, reestruturação de cidades sustentáveis e muito mais. A luta ecológica é muito mais do que romântica e verdista ou de um partido apenas, é a construção de um outro mundo possível, do que depende radicalmente a vida presente e principalmente futura.

Refletir em cima do Aquecimento global é compreender porquês, buscar mudar fatos como: de cada 4 pessoas, uma terá câncer (enquanto que na década de 50, era uma em cada 40 - ao mesmo tempo, passamos de 45 aditivos químicos na alimentação para mais de 2000 hoje !!!). È compreender que o uso de energia tem um custo muito maior do que o que pagamos; é internalizar externalidades, como no caso da carne. O consumo de carne é hoje um dos maiores vilões socioecológicos: destruição da Amazônia, da Mata Atlântica (onde vivemos), do solo, poluição intensa de rios, aumento de fome no mundo - pois a carne não é para os pobres, e toma o lugar dos grãos etc. Refletir em cima do Alerta Global é despertar para o Zeitgeist, para o aqui e agora.

Abrir os olhos ao aquecimento global, é promover a cidadania planetária, a esperança na humanidade, a vida das crianças, o respeito à vida não-humana, e a humildade – ou seja, o humus, respeito à terra, de onde todos viemos e para onde retornamos.

Neste sentido, finalizo com uma história sobre o surgimento do ser humano e o Cuidado. Diz a lenda narrada por Virgílio: "Um dia, quando Cuidado pensativamente atravessava um rio, ela resolveu apanhar um pouco de barro e começar a moldar um ser, que ao final apresentou forma humana. Enquanto olhava para sua obra e avaliava o que tinha feito, Júpiter (céus) se aproximou. Cuidado pediu então a ele, para dar o espírito da vida para aquele ser, no que Júpiter prontamente a atendeu. Cuidado, satisfeita, quis dar um nome àquele ser, mas Júpiter, orgulhoso, disse que o seu nome é que deveria ser dado a ele. Enquanto Cuidado e Júpiter discutiam, Terra surge e lembra que ela é quem deveria dar um nome àquele ser, já que ele tinha sido feito da matéria de seu próprio corpo - o barro. Finalmente, para resolver a questão, os três disputantes aceitaram Saturno como juiz. Saturno decidiu, em seu senso de justiça, que Júpiter, quem deu o espírito ao ser, receberia de volta sua alma depois da morte; Terra, como havia dado a própria substância para o corpo dele, o receberia de volta quando morresse. Mas, disse Saturno ainda, ‘já que Cuidado antecedeu a Júpiter e à Terra e lhe deu a forma humana, que ela lhe dê assistência: que o acompanhe, conserve sua vida e lhe dê o apoio enquanto ele viver. Quanto ao nome, ele será chamado Homo (o nome em latim para Homem), já que ele foi feito do humus da terra’"[1].

[1] Ver:"Care". In: Encyclopedia of Bioethics, 2nd. ed., New York, Simon & Schuster Macmillan, 1995, v. 5.

Marcelo Pelizzoli é professor do Doutorado em Filosofia e do Mestrado em Gestão e Políticas Ambientais da UFPE. Autor das obras: A emergência do Paradigma ecológico (1999), Correntes da ética ambiental (2003), Bioética como novo paradigma (2007). Além de comentarista da Sexta Cultural do Opinião Pernambuco (TVU)